Muitos sonham em ser artista à procura da vida de estrelato, fortuna, adoração e glória nos é vendida diariamente. A verdade, no entanto, sobre a absoluta maioria dos artistas é que se trata de uma vida de dedicação quase cega, com pouco dinheiro e público, muito trabalho recompensado na maioria das vezes por nada muito além do que o amor por realizá-lo. A história recentemente ocorrida com o ator italiano Giovanni Mongiano é um comovente, contundente e até mesmo belo exemplo dessa realidade.
Seria somente mais uma apresentação do espetáculo Improvisações de um ator que lê, de autoria do próprio Giovanni, não fossem dois detalhes diametralmente opostos: tratava-se da 70a apresentação do espetáculo, o que seria um bom motivo para aquela ser uma noite especial mas, ao chegar ao Teatro del Popolo de Gallarte, na cidade de Lombardia, no norte da Itália, o ator de 65 anos descobriu que nenhum ingresso havia sido vendido para aquela noite. Nenhum espectador assistiria essa apresentação.
Com 45 anos de palco, Giovanni não titubeou, e cumpriu a celebração merecida, transformando aquela desértica sala no cenário sim de uma comemoração especial: ele apresentou seu monólogo na íntegra, exatamente como seria se estivesse diante de um teatro lotado – Giovanni fez a 70a apresentação de seu espetáculo para ninguém, e o que seria uma noite para se esquecer, tornou-se um ato de resistência, uma declaração de amor ao ofício e à arte, que ganhou o mundo.
“Decidi fazer isso de um golpe só. Foi um impulso irresistível. Eu tinha de fazê-lo. Um gesto de amor, mas também simbólico e provocativo”, afirmou o ator para o jornal italiano Corriere della Sera, lembrando que já havia recebido pela apresentação, e que poderia simplesmente ter ido embora.
Da imprensa italiana para a imprensa mundial foi um passo, e o ato solitário de Giovanni ganhou contornos simbólicos, abrindo debate não só sobre quando uma apresentação deva ser cancelada, como também sobre a importância da valorização da cultura e o descaso geral com as artes.
O palco é um lugar de reflexão e expansão de nossas consciências e possibilidades – um lugar especial para se pensar, repensar e reinventar o mundo. Assim, imbuído de tal espírito, Giovanni apresentou seu espetáculo. Essa foi a primeira vez em sua carreira que algo assim lhe ocorreu, mas certamente não será a última que um artista passará por isso.
Trata-se, afinal, de um ofício de amor e dedicação quase que irrestritas, no qual as conquistas se dão por caminhos tortuosos e inesperados, mas sem o qual o mundo se torna necessariamente um lugar menor e mais obscuro – mesmo que ninguém esteja lá para assistir.
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