Uma variante mortal da varíola dos macacos está surgindo na África Central

Depois de perder uma filha devido à varíola dos macacos, Blandine Bosaku, de 18 anos, que está grávida, recebeu tratamento com antibióticos numa clínica rural no norte da República Democrática do Congo. Quando uma mulher grávida adoece com varíola dos macacos, a doença pode ser transmitida ao feto, reduzindo as probabilidades de sobrevivência do bebé. Os especialistas em saúde pública estão a pedir mais vigilância sobre as doenças nestas zonas remotas de África para detetar melhor os primeiros sinais de um surto.

Uma mulher grávida de oito meses coberta dos pés à cabeça com lesões. Crianças pequenas com febre e feridas dolorosas. Um pai a pedir dinheiro para comprar antibióticos para o filho doente de cinco anos depois de ter sepultado outras duas crianças infectadas com varíola dos macacos.

Estas memórias atormentam Divin Malekani, ecologista da Universidade de Kinshasa, na República Democrática do Congo (RDC), que faz consultoria em projetos da Wildlife Conservation Society, uma organização sem fins lucrativos, para ajudar a reduzir a exposição humana a doenças transmitidas por animais. “Vi muitos casos de pessoas doentes com varíola dos macacos”, diz Divin Malekani, referindo-se a uma viagem que fez no ano passado a uma província remota no noroeste do país.
O rio Sangha é uma rota comercial popular para mercadorias e caça selvagem, como macacos, roedores e veados caçados e vendidos em mercados de aldeias na República do Congo e nos vizinhos Camarões.
A varíola dos macacos, uma doença viral relacionada com a varíola que tem duas variantes conhecidas, foi nomeada em 1958 depois de ter sido identificada numa colónia de macacos de pesquisa num laboratório em Copenhaga. (Os cientistas acreditam que são os roedores, e não os primatas, o principal reservatório da doença.)

A forma mais moderada desta doença é a Clade II, também conhecida por variante da África Ocidental, que se tornou global em maio. Até ao momento, esta variante já infetou mais de 70.000 pessoas, matando pelo menos 30, em mais de uma centena de países e territórios, sendo que a esmagadora maioria são homens homossexuais. Os casos, tanto nos EUA como globalmente, estão a diminuir graças à vacinação e a alterações no comportamento sexual.

Os Centros de Controlo de Doenças de África relatam que este ano a maioria dos 3.500 casos suspeitos de Clade I (ou estirpe da Bacia do Congo), incluindo mais de 120 mortos, são na RDC. A Nigéria, onde começou o surto de Clade II, teve cerca de 700 casos suspeitos, com menos de 10 mortos.

Os especialistas em saúde consultados pela National Geographic sobre o aumento constante da variante Clade I na África Central dizem que os países devem preocupar-se com a ameaça que representam para as comunidades globais e tomar medidas mais fortes para impedir que esta e outras doenças transmitidas por animais se propaguem pelo mundo inteiro.

“Se a estirpe da África Ocidental se pode propagar pela Europa, América e por outras partes do mundo, a estirpe mais virulenta e patogénica da Bacia do Congo também pode chegar aos mesmos locais”, diz Dimie Ogoina, especialista em doenças infeciosas da Universidade Niger Delta, na região sul da Nigéria. “As partes internacionais interessadas na saúde devem ser deliberadas na ajuda dada para lidar com a varíola dos macacos e outras doenças em África. Porque se não o fizermos, isto vai regressar para nos atormentar.”

Alertas ignorados

Dimie Ogoina tem algum conhecimento sobre a varíola dos macacos, porque é o pediatra que, em setembro de 2017, confirmou a doença num menino de 11 anos – o primeiro caso de varíola humana na Nigéria em quase 40 anos. É também o investigador que alertou, há quatro anos, que parecia haver uma alteração alarmante não apenas na forma como o vírus era transmitido, mas também em quem estava a ser infetado.
Arthur Bengo, de 28 anos, ficou infetado com varíola dos macacos depois de comer um macaco doente que tinha caçado para alimentar a sua família, no norte da República Democrática do Congo. Conforme a febre aumentava, Arthur Bengo desenvolveu lesões dolorosas que deixaram cicatrizes no seu rosto e corpo. Os Centros de Controlo de Doenças de África relatam que este ano já se registaram mais de 3.500 casos de varíola dos macacos na RDC, incluindo mais de 120 mortes.
Quando este surto emergiu, os especialistas acreditavam que a doença se estava a comportar da mesma forma observada noutras partes de África, afetando principalmente pessoas que tinham interagido com animais selvagens infetados com varíola dos macacos, muitas vezes enquanto caçavam, preparavam carne ou tinham contacto de proximidade com uma pessoa que contraíra a doença através de um animal. Normalmente, estes surtos desvaneciam.

Contudo, inesperadamente, Dimie Ogoina e os seus colegas repararam numa tendência invulgar: a maioria das pessoas diagnosticadas com varíola dos macacos na sua clínica não vivia em áreas rurais – eram jovens profissionais da classe média que viviam em cidades movimentadas, e as suas lesões estavam fortemente concentradas nos genitais. A comunidade científica duvidou das descobertas de Dimie Ogoina. “O que estávamos a observar era fora do normal”, diz Dimie. “Portanto, as pessoas não estavam dispostas a aceitar.”

“Os casos de varíola dos macacos têm continuado a aumentar nos últimos 12 anos na RDC, bem como noutros países da África Central e Ocidental”, diz Anne Rimoin. Embora o modo de transmissão da Clade I – que ainda passa da vida selvagem infetada para as pessoas – seja diferente da forma como a doença se propagou da África Ocidental para o mundo, isso pode mudar. “Podemos não estar a ver isso agora, mas não significa que não iremos ver. Se houve alguma coisa que a pandemia de COVID-19 nos ensinou”, diz Anne, “é que uma infeção em qualquer lugar tem potencial para uma infeção em todo o lado”.

Prevenção de transbordamentos
Prevenir transbordos
Mais de 60 anos depois de a varíola dos macacos ter sido descoberta em macacos de laboratório, os cientistas ainda continuam a tentar identificar os animais selvagens onde o vírus vive, cresce e multiplica.

Em 2012, Divin Malekani, ecologista da Universidade de Kinshasa, juntou-se a uma equipa de investigação que tentava reduzir o número de animais suspeitos. Os cientistas capturaram ou compraram a caçadores mais de 350 mamíferos numa área da RDC onde as infeções por varíola dos macacos ultrapassavam em média as 660 pessoas por ano. Os investigadores encontraram anticorpos contra a varíola em sete animais, incluindo em esquilos, num arganaz africano e num rato Cricetomys – animais que são fontes de alimento. Na RDC, de acordo com as Nações Unidas, cerca de 27 milhões de pessoas – um quarto da população – lutam contra a fome. Muitas não têm escolha a não ser caçar para sobreviver.
A cidade de Oesso, nas margens do rio Sangha, na República do Congo, é um importante centro de comércio de carne selvagem. Animais e outros bens são transportados em canoas de madeira, automóveis e motorizadas. Os vendedores locais oferecem a carne a metade do preço do que esta é obtida nas grandes cidades, onde um surto se pode propagar rapidamente, infetando milhões.

A possibilidade de haver carne selvagem infetada com varíola dos macacos a chegar a um mercado em Kinshasa, a maior cidade de África, onde é consumida como uma iguaria – um gostinho de casa – preocupa Divin Malekani e outros especialistas. Os países precisam de ajudar as pessoas a reduzir o consumo de carne selvagem, para evitar o aparecimento de pandemias, diz Sarah Olson, epidemiologista da Wildlife Conservation Society. “Isto não vai fechar o génio novamente na lâmpada, mas pode reduzir a futura transmissão de varíola dos macacos e de outras doenças da vida selvagem para as pessoas.”

Ao conciliar os países em preparação para responder às doenças infeciosas, a Organização Mundial de Saúde está a tomar medidas para criar um tratado pandémico internacional que seja vinculativo juridicamente. Alguns investigadores estão preocupados com o facto de o foco estar demasiado concentrado no tratamento da doença quando esta chega aos humanos, em vez de nos esforços para impedir que os patógenos “transbordem” dos animais para as pessoas.
Henriete Bakete Wanda, de 13 anos, está em isolamento num quarto hospitalar onde está a receber tratamento com antibióticos para uma infeção por varíola dos macacos, depois de a sua mãe ter rapidamente reconhecido os sintomas e procurado ajuda.


Enquanto isso, na RDC, formadores do Fundo Internacional de Conservação e Educação estão a viajar de aldeia em aldeia, onde mostram vídeos com habitantes locais a falar sobre as suas experiências com a varíola dos macacos e formas de evitar a doença.

Um homem conta que a febre do seu bebé estava tão alta que ele sentiu como se estivesse a dormir ao lado de uma fogueira. No hospital, o bebé desenvolveu lesões que se espalharam pelo corpo inteiro, incluindo rosto, mãos e pés. A doença ficou tão grave que o bebé faleceu, deixando os pais perplexos. Outros aldeões partilham histórias semelhantes sobre a intensidade da estirpe mais mortal da varíola dos macacos – crianças com “inchaços” no rosto e gargantas tão inchadas que mal conseguem comer ou beber.

“Se tivéssemos de lançar os dados, na verdade até tivemos sorte com a variante que se espalhou pelo mundo inteiro”, diz Sarah Olson. “Ainda há uma oportunidade para compreender o que está a acontecer com a outra variante do vírus antes de as coisas descarrilarem.”

Photo BYBRENT STIRTON/fonte via

20 vezes em que o cenário da foto chamou mais atenção do que o resto

Você já ouviu falar em “photobombing?”. Trata-se de um termo que praticamente não tem como ser traduzido para o português, mas que significa o ato de deliberadamente “estragar” a foto de uma outra pessoa de forma cômica e hilária. Pode parecer bobagem, mas a verdade é que muitas pessoas são verdadeiras especialistas nisso, e acabam criando algumas cenas realmente engraçadas.

Nesta lista, você vai conferir uma série de fotos onde a paisagem ou o fundo acabam chamando mais atenção do que aquilo que realmente estava sendo fotografado.

Confira:

  1. E o prêmio de melhor salva-vidas do mundo vai para…

GFBIGFAN

  1. “Minha mãe estava me visitando, e recebeu essa surpresa durante a foto que eu tirei”.

TexasPooneTappa

  1. O melhor photobomb da história.

twofirstnamez

  1. Alguém traga um prêmio para este cara.

Lutya

  1. Eu tenho certeza que os noivos não ficaram nem um pouco irritados com este photobomb.

honor_your_heart

  1. Golfinhos são animais brincalhões, e aparentemente gostam de atrapalhar fotografias alheias.

mrpickem1

  1. Esta provavelmente é a melhor foto que já foi tirada no Cristo Redentor.

reddit.com

  1. Quando tempo você demorou para perceber?

buchnasty

  1. Fui tirar uma foto da minha namorada quando de repente…

FatKeystone

  1. Quando você quer aparecer na foto de qualquer jeito.

thatwasamusing

  1. Onde está o cachorro?

thepunis

  1. “Minha filha é especialista em photobombing”.

Big-Custard2645

  1. “Esta família tirou uma onda na nossa foto”.

NanoSama

  1. O cavalo mais divertido que você vai ver hoje.

MelissaEnglePhotography

  1. “Meus pais fizeram uma nova amiga durante as férias”.

kebulatr

  1. “Eu estraguei esta foto do casamento do meu irmão”.

da_purp_rolla

  1. Este repórter não checou o seu cenário antes de entrar ao vivo diretamente da sua casa, na pandemia.

IDonyKnow224

  1. Não tem como ficar irritado com um “invasor” como esse!

sir_stegosaurous_rex

  1. Ele tem o gingado!

rhodahxo

  1. Bem na hora!

paigebartos/fonte/via

Mulheres guerreiras do Daomé ganham estátua espetacular de 30 metros no Benim

Uma estátua de 30 metros de altura representando uma guerreira amazona foi inaugurada em Cotonu, maior cidade do Benim, em homenagem ao exército de mulheres do Reino de Daomé, onde hoje é o Benim.

A imagem foi instalada na Esplanada das Amazonas, uma praça pública no centro da cidade, e celebra o único exército inteiramente feminino que se tem notícia na história moderna, que defendeu o reino que existiu entre os anos de 1625 e 1894.

Com 30 metros, a estátua em bronze celebra as amazonas e a história “apagada” do país

Exército de mulheres negras 

Apesar de Daomé ter sido um dos mais poderosos da África no período, a história do exército de amazonas é pouco detalhada, bem como do reinado de sua única rainha, Tassi Hangbe, que governou entre 1708 e 1711.

Alguns historiadores afirmam que as guerreiras eram originalmente caçadoras de elefantes, convocadas para lutar contra povos rivais e depois contra a França.

Historiadores sugerem que a estátua representa a rainha Tassi Hangbé, que criou o exército

As mulheres guerreiras se tornaram a guarda real de Hangbe, que assumiu o poder após a morte de seu irmão gêmeo, o rei Akaba.

A rainha teria convocado as tropas de guerreiras, que seguiriam defendendo os reis posteriores à queda de Hangbe. Em 1882, o exército de 6 mil mulheres seria liderado pela guerreira Seh-Dong-Hong-Beh, em vitória triunfal contra os colonos franceses.

A guerreira Seh-Dong-Hong-Beh, que liderou as amazonas, em desenho de 1851

A guerreira Seh-Dong-Hong-Beh, que liderou as amazonas contra os franceses, em desenho de 1851

A estátua de bronze mostra uma amazona com uma machete e um rifle, lembrando o lema “Vencer ou morrer”, que movia as amazonas de Daomé no campo de batalha: segundo consta, o exército só desapareceu junto com a queda do Reino de Daomé, no final do século 19. As poucas informações sobre o reino e as guerreiras é fruto de um esforço francês pelo apagamento da memória do país, e a imagem se junta a outros diversos monumentos inaugurados no Benim.

© fotos 1, 2: Twitter/@PresidenceBenin/reprodução /fonte via

© fotos 3, 4: Wikimedia Commons

Amazonas de Daomé: o exército de mulheres mais temido da história

amazonas áfrica

Veteranas ahosi em celebração no ano de 1908

Em 1892, a França estava no pico do colonialismo na África, invadindo diversos países e subjugando milhões de africanos de diversas etnias e culturas à sua dominação imperialista. Ao redor de toda a região do Sahel houve resistência por parte das populações dominadas, mas um local foi especialmente difícil para os militares franceses por conta das ‘Amazonas’.

O reino do Daomé, localizado na área do atual Benin, foi uma das civilizações mais poderosas de toda a África pós-colonial. O Reino possuía agricultura forte e desenvolvida, bem como uma intensa atividade comercial, em especial com portugueses, comercializando prisioneiros de guerra para a escravização no Brasil e no Caribe.

A força de guerra do Reino Daomé, entretanto, não era composta por homens: em uma sociedade extremamente militarizada – considerada a Esparta africana-, muitas mulheres tinham posições de poder dentro da estrutura militar daomesiana. Por conta do intenso comércio com europeus, os Daomé tinham acesso a rifles Winchester e pistolas, ou seja, uma grande capacidade bélica em comparação a outros inimigos.

As ‘amazonas’ do Daomé deram muito trabalho aos colonizadores; a sociedade era vista como invencível em suas batalhas internas contra outros povos africanos. Apesar da França ter conquistado a região no fim do século XIX,  a dificuldade dos franceses em vencer as guerreiras ahosi e a própria existência de uma massa de mulheres militarizadas se tornou um tema de curiosidade para intelectuais, viajantes e militares franceses.

“O valor das amazonas é real. Treinadas desde a infância com os mais árduos exercícios, constantemente incitadas à guerra, elas levavam às batalhas uma fúria verdadeira e um ardor sanguinário… Inspirando com sua coragem e sua energia indomável tropas que as seguiam”, escreveu em 1895 o major francês Léonce Grandin.

Os relatos sobre as amazonas do Reino Daomé são uníssonos: elas haviam recebido extenso treinamento militar e eram extremamente fortes. Ainda que os colonizadores as odiassem – e deixassem isso claro em seus relatos -, era inegável o seu papel central na sociedade do Daomé.

Os colonizadores se surpreendiam com a habilidade das amazonas em vencer elefantes e animais de grande porte. Outro costume das amazonas era cortar a cabeça de seus inimigos e entregá-las ao monarca, em uma demonstração de força e poder.

Referências artísticas às ahosi ocupam cidades do Sahel até os dias de hoje

Entretanto, uma observação mais aguçada sobre a cultura Daomé mostra que as ahosi ‘se tornavam homens’ após seu treinamento militar. A sociedade das ahosi reforçava que mulheres eram covardes – inclusive em cantos de guerra das próprias guerreiras – e uma ideia de que as amazonas eram ‘novos homens’ era amplamente adotada na região.

“Ainda que, em um primeiro momento, as “amazonas” do Daomé nos leve a crer em um rompimento dos valores condicionados a homens e mulheres, ao analisa-las vemos a permanência de preceitos tradicionais. É errôneo buscar um empoderamento feminino nos moldes atuais em mulheres daomeanas do século XIX”, explica a historiadora Danielle Yumi Suguiama em sua dissertação de mestrado “O Daomé e suas “amazonas” no século XIX: leituras a partir de Frederick E. Forbes e Richard F. Burton”, publicada em 2019 pela UNIFESP.

Entretanto, a própria autora afirma que a simples ideia de mulheres em um posto como esse já era algo extremamente simbólico. “Apesar de se auto intitularem homens, a existência e atuação das “amazonas” não pode deixar de lado seu sentido simbólico de redesenhar as fronteiras entre os gêneros e seus espaços não podem ser ignorados”, explica.

Com informações do Portal Geledés.

Fotos: Foto 1: Domínio Público Foto 2: © YZ

‘A Mulher Rei ,a história real das guerreiras Agojie

Para se tornar uma Agojie, as recrutas passavam por treinamento intensivo

O filme “A Mulher Rei“, protagonizado por Viola Davis, chegou arrebatador aos cinemas. Ele conta a história das mulheres guerreiras Agojie – ou Ahosi, Mino, Minon e até Amazonas. Mas o filme se baseia em fatos? Quem eram essas mulheres poderosas?

O reino do Daomé, na África Ocidental, teve seu auge na década de 1840 quando ostentava um exército de 6 mil mulheres conhecido em toda a região por sua bravura. Essa força, conhecida como Agojie, invadiu aldeias sob o manto da noite, fez prisioneiros e decepou cabeças usadas como troféus de guerra, garantindo a sobrevivência de seu povo.

As guerreiras ficaram conhecidas pelos invasores europeus como “Amazonas”, que às comparavam com as mulheres do mito grego.

A história real das guerreiras Agojie

A história real das guerreiras Agojie comandadas por Viola Davis em ‘A Mulher Rei’

“A Mulher Rei” (The Woman King) traz Viola Davis como uma líder fictícia das Agojie. Dirigido por Gina Prince-Bythewood, o filme se passa enquanto o conflito engole a região e a colonização europeia se aproxima.

Como escreve Rebecca Keegan, do Hollywood Reporter, “The Woman King” é “o produto de mil batalhas” travadas por Davis e Prince-Bythewood, que falaram sobre os obstáculos que a equipe de produção enfrentou ao lançar um épico histórico centrado em fortes mulheres negras.

Viola Davis é uma comandante Agojie em "A Mulher Rei"

Viola Davis é uma comandante Agojie em ‘A Mulher Rei’

“A parte do filme que amamos também é a parte do filme que é aterrorizante para Hollywood, ou seja, é diferente, é nova”, diz Viola a Rebecca Keegan, do Hollywood Reporter. “Nem sempre queremos diferente ou novo, a menos que você tenha uma grande estrela ligada a isso, uma grande estrela masculina. … [Hollywood] gosta quando as mulheres são bonitas e loiras ou quase bonitas e loiras. Todas essas mulheres são escuras. E elas estão batendo… em homens. Então lá vai.”

É uma história real?

Sim, mas com licença poética e dramática. Embora os traços gerais do filme sejam historicamente precisos, a maioria de seus personagens são fictícios, incluindo Nanisca de Viola e Nawi de Thuso Mbedu, uma jovem guerreira em treinamento.

Rei Ghezo (interpretado por John Boyega) é a exceção. De acordo com Lynne Ellsworth Larsen, uma historiadora da arquitetura que estuda a dinâmica de gênero no Daomé, Ghezo (reinou de 1818 a 1858) e seu filho Glele (que reinou de 1858 a 1889) presidiram o que é visto como “a idade de ouro da história do Daomé”, inaugurando uma era de prosperidade econômica e força política.

“A Mulher Rei” começa em 1823 com um ataque bem-sucedido das Agojie, que libertam homens que seriam destinados à escravização nas garras do Império Oyo, um poderoso estado iorubá hoje ocupado pelo sudoeste da Nigéria.

O reino do Daomé ostentava um exército de 6 mil mulheres

O reino do Daomé ostentava um exército de 6 mil mulheres

Uma trama paralela acompanha o repúdio de Nanisca ao comércio de escravos – principamente por ter experimentado seus horrores pessoalmente – instigando Ghezo a encerrar o relacionamento próximo de Dahomey com os traficantes de escravos portugueses e mudar para a produção de óleo de palma como principal exportação do reino.

O verdadeiro Ghezo, de fato, libertou com sucesso Dahomey de seu status tributário em 1823. Mas o envolvimento do reino no comércio de escravos se manteve até 1852, após anos de pressão do governo britânico, que havia abolido a escravidão (por razões não totalmente altruístas) em suas próprias colônias em 1833.

Quem eram as Agojie?

A primeira menção registrada das Agojie data de 1729. Mas o exército foi possivelmente formado ainda mais cedo, no início da existência do Daomé, quando o rei Huegbadja (reinou por volta de 1645 a 1685) criou um corpo de mulheres caçadoras de elefantes.

As Agojie atingiram seu auge no século 19, sob o reinado de Ghezo, que as incorporou formalmente ao exército de Dahomey. Graças às guerras em curso no reino e ao comércio de escravos, a população masculina de Dahomey caiu significativamente, criando uma oportunidade para as mulheres entrarem no campo de batalha.

Guerreira agojie

Guerreira Agojie

“Mais talvez do que qualquer outro estado africano, Dahomey foi dedicado à guerra e ao saque de escravos”, escreveu Stanley B. Alpern em “Amazons of Black Sparta: The Women Warriors of Dahomey“, o primeiro estudo completo em língua inglesa das Agojie . “Também pode ter sido o mais totalitário, com o rei controlando e arregimentando praticamente todos os aspectos da vida social.”

As Agojie incluíam voluntárias e recrutas forçadas, algumas delas capturadas com 10 anos de idade, mas também pobres, e meninas rebeldes. Em “A Mulher Rei”, Nawi acaba no exército depois de se recusar a se casar com um pretendente idoso.

Todas as mulheres guerreiras de Dahomey eram consideradas ahosi, ou esposas do rei. Eles viviam no palácio real ao lado do rei e suas outras esposas, habitando um espaço em grande parte dominado por mulheres. Além dos eunucos e do próprio rei, nenhum homem era permitido no palácio após o pôr do sol.

Como Alpern disse à revista Smithsonian em 2011, as Agojie eram consideradas as esposas de “terceira classe” do rei, pois normalmente não compartilhavam sua cama ou geravam seus filhos.

As guerreiras Agojie eram conhecidas por sua bravura e por sairem vencedoras das batalhas

As guerreiras Agojie eram conhecidas por sua bravura e por sairem vencedoras das batalhas

Por serem casadas com o rei, elas foram impedidas de fazer sexo com outros homens, embora o grau em que esse celibato foi imposto esteja sujeito a debate. Além do status privilegiado, as guerreiras tinham acesso a um suprimento constante de tabaco e álcool, além de possuir seus próprios servos escravizados.

Para se tornar uma Agojie, as recrutas passavam por treinamento intensivo, incluindo exercícios projetados para ficarem firmes ao derramamento de sangue.

Em 1889, o oficial da marinha francesa Jean Bayol testemunhou Nanisca (que provavelmente inspirou o nome da personagem de Viola), uma adolescente “que ainda não havia matado ninguém”, passar facilmente por um teste. Ela teria decaptado um prisioneiro condenado, depois espremendo e engolindo o sangue de sua espada.

As Agojie eram divididas em cinco ramos: mulheres de artilharia, caçadoras de elefantes, mosqueteiras, mulheres navalhas e arqueiras. Surpreender o inimigo era da maior importância.

Embora os relatos europeus das Agojie variem bastante, o que “é indiscutível … é seu desempenho constantemente excelente em combate”, escreveu Alpern em “Amazons of Black Sparta”.

Para se tornar uma Agojie, as recrutas passavam por treinamento intensivo

Para se tornar uma Agojie, as recrutas passavam por treinamento intensivo

O domínio militar de Dahomey começou a diminuir na segunda metade do século 19, quando seu exército falhou repetidamente em capturar Abeokuta, uma capital Egba bem fortificada no que hoje é o sudoeste da Nigéria.

Historicamente, os encontros de Dahomey com colonizadores europeus giraram principalmente em torno do comércio de escravos e missões religiosas. Mas, em 1863, as tensões com os franceses se agravaram.

A existência – e o domínio – das mulheres guerreiras de Dahomey perturbam a “compreensão dos papéis de gênero dos franceses e o que as mulheres deveriam fazer” em uma sociedade “civilizada”.

A queda do império

Depois da tentativa de um tratado de paz e de algumas perdas de batalhas, acabaram retomando os combates. De acordo com Alpern, ao receber a notícia da declaração de guerra dos franceses, o rei dahomeano disse: “Na primeira vez, eu não sabia como fazer a guerra, mas agora eu sei. … Se você quer guerra, estou pronto”

Ao longo de sete semana, em 1892, o exército de Dahomey lutou bravamente para repelir os franceses. As Agojie participaram de 23 combates, conquistando o respeito do inimigo por seu valor e dedicação à causa.

No mesmo ano, as Agojie sofreram provavelmente suas piores perdas, com apenas 17 soldados retornando de uma força inicial de 434. O último dia de combate, relatou um coronel da marinha francesa, foi “um dos mais assassinos” de toda a guerra, começando com a dramática entrada das “últimas amazonas … nos oficiais”.

Os franceses tomaram oficialmente a capital do Daomé, Abomey, em 17 de novembro daquele ano.

As Agojie hoje

Em 2021, o economista Leonard Wantchekon, natural de Benin e que lidera buscas para identificar descendentes de Agojie, disse ao Washington Post que a colonização francesa provou ser prejudicial aos direitos das mulheres no Daomé, com colonizadores impedindo mulheres de serem lideranças políticas e acessarem escolas.

“Os franceses garantiram que essa história não fosse conhecida”, explicou. “Eles disseram que estávamos atrasados, que precisavam nos ‘civilizar’, mas destruíram oportunidades para as mulheres que não existiam em nenhum outro lugar do mundo.”

Nawi, a último Agojie sobrevivente conhecida com experiência no campo de batalha (e a provável inspiração para a personagem de Mbedu), morreu em 1979, com mais de 100 anos. Mas as tradições Agojie continuaram muito depois da queda de Dahomey.

Quando a atriz Lupita Nyong’o visitou o Benin para um especial do Smithsonian Channel de 2019, ela conheceu uma mulher identificada pelos moradores como uma Agojie que havia sido treinada por guerreiras mais velhas quando criança e mantida escondida em um palácio por décadas.

Foto de destaque: Chris Hellier/Corbis via Getty Images
Demais imagens: Pictures From History/Universal Images Group via Getty Images